Lidar com o assédio sexual faz parte do cotidiano de mulheres do mundo todo. No Brasil, 77% delas já foram vítimas de agressores. Visando diminuir os casos em transporte público, medidas vêm sendo aplicadas pelo governo, empresas privadas e também pelas próprias mulheres vítimas da situação.

CAMPANHA CONTRA O ASSÉDIO ÁS MULHERES NO METRÔ

Em 2014, a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo aprovou o projeto de lei do deputado Jorge Caruso (PMDB), o qual obrigava empresas de transporte urbano a manterem um vagão a cada trem para uso exclusivo de mulheres. O chamado vagão rosa foi vetado pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) um mês depois. A ideia gerou discussões entre grupos feministas. “Além de não resolver nada e reforçar a heteronormatividade e o próprio machismo, os vagões exclusivos ainda fomentam uma outra forma de opressão de gênero”, escreve Marília Moschkovich, do blog Outras Palavras, para a CartaCapital.

Com a ascensão do uso dos aplicativos de táxi e o aumento de casos de assédio, Ana Clara Leite, analista de sustentabilidade de 23 anos, criou uma petição para que empresas como Easy Taxi e 99taxis dessem a opção de não divulgação do número de telefone dos solicitantes da corrida. O abaixo-assinado da paulistana obteve 27.295 assinaturas e, a partir de março de 2015, os aplicativos deixaram de fornecer automaticamente o número de telefone dos passageiros.

Nenhuma medida, entretanto, garante a total segurança das mulheres. Pensando nisso, motoristas criaram cooperativas de táxi exclusivamente femininas. Normalmente denominado de táxi rosa, já funciona em Nova Deli (Índia), Dubai (Emirados Árabes), Cairo (Egito), Puebla (México), Londres (Inglaterra), Boston e Nova Iorque (EUA). No Brasil, cooperativas em Belém e no Rio de Janeiro já dão preferência para mulher no volante. Já em Belo Horizonte, apesar de não existir cooperativa exclusivamente feminina, há lista de motoristas que ajudam mulheres a encontrarem taxistas.

A iniciativa, contudo, pode, assim como no caso do vagão rosa, tampar o sol com peneira. “Em um primeiro momento, ela poderia parecer benéfica por buscar proteger as mulheres, mas ela reforça a ideia de que as mulheres não estão em segurança no espaço público, por isso precisam de espaços privados ou exclusivos”, opina Bianca Santana, autora do livro “Quando me descobri negra” e fundadora da ONG feminista Casa de Lua. “É como se essa ideia partisse da premissa de que a mulher não pode mesmo circular no espaço ou no transporte público.  Caso uma mulher não queira ou consiga pegar o táxi rosa por qualquer razão e sofrer abuso no táxi comum, imagina o precedente para que afirmem “Ela queria! Se não quisesse teria ido para o rosa”.

A brasileira pioneira no ramo discorda. “O projeto ainda é muito pequeno para questionamentos desse tipo”, entende Francinete Matos, criadora do projeto Lady’s Táxi de Belém que conta com 14 motoristas. Ao longo dos 31 anos de vida, passou por volante de caminhão e ônibus, mas há dois anos viu-se trabalhando numa cooperativa de táxi ao lado de 19 homens. “Reparei que as mulheres chegavam ao ponto de táxi e queriam fazer a corrida comigo, mas eles reclamavam e diziam que não era a minha vez”.

A empreendedora reuniu as amigas no grupo de Whats App e sugeriu que abrissem a Lady’s Táxi. Cada uma faz cerca de 30 corridas por dia. Aos finais de semana, a demanda aumenta. “Trabalhamos 24 horas, pois muitas mulheres dão preferência para nós durante a madrugada”. No banco do passageiro, entretanto, não sentam apenas pessoas do sexo feminino. “Atendemos homens sem medo. Todos nossos clientes estão cadastrados num banco de dados com endereço e telefone”.

Francinete comprou o primeiro carro da cooperativa e decidiu colocar bancos cor-de-rosa. “Além de gostar da cor, acredito que representa feminilidade”, justifica. Os 35 veículos da Pink Taxi, de Puebla, no México, são inteiramente rosa. Assim como os das empresas de Dubai e do Cairo, que também levam a cor no nome: Pink Taxi. O aplicativo americano Chariot for Women, que iniciou os trabalhos no mês de abril de 2016 em Boston, tem o layout predominantemente rosa. Não é coincidência. “A escolha que parece inofensiva é o começo de todo um processo de socialização e estereótipos de gêneros, coisa que o feminismo abomina”, coloca Amanda Cavalcanti, membro do grupo de ação da Frente Feminista Lisandra, da Faculdade Cásper Líbero.