Começou o horário eleitoral. E é bem provável que, até o dia da eleição, algumas músicas com letras fáceis estejam grudadas em nossas mentes. Esses são os jingles eleitorais mais bem sucedidos. Na história da nossa República, muitos deles não se despediram com o fim das eleições. Acabaram ficando na memória do povo.
Em agosto de 2011, o especialista Carlos Manhanelli lançou o livro “Jingles Eleitorais e Marketing Político – Uma Dupla do Barulho”, pela Summus Editorial. Manhanelli, que há 38 anos estuda e coleciona jingles eleitorais, conta os segredos para o sucesso de uma campanha eleitoral com o uso da música. Uma dica: o jingle deve conter quatro itens essenciais – nome do candidato, número do candidato, bandeira da campanha e partido do candidato. De resto, conta-se com a criatividade do compositor para conseguir grudar na cabeça do povo um refrão que pode mudar o país.
Jingles Eleitorais e Marketing Político – Uma Dupla do Barulho”, pela Summus Editorial. Manhanelli
O professor Antonio Melo, que ministra o curso de Marketing Eleitoral na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), conversou com o Blog do Curioso sobre essa estratégia política musical:
Blog do Curioso: Qual é a importância do jingle nas campanhas políticas?
Prof. Antonio Melo: O jingle é fundamental, pois sintetiza o conceito da campanha e provoca emoção no eleitorado. É importante não só para divulgar as propostas de um candidato, mas também para expor as pisadas de bola dos adversários.
Blog do Curioso: Qual é o segredo de um bom jingle eleitoral?
Prof. Antonio Melo: Um bom jingle precisa ter as informações que levam ao voto do eleitor. A mais importante delas é o número do candidato. Principalmente quando se trata de alguém que trocou de partido. Nesses casos, o novo número tem que receber um bom destaque no jingle. Além disso, músicas de refrão forte e fácil memorização, aquelas que grudam na cabeça, costumam ser bem sucedidas. O humor também pode ser uma boa estratégia, usada principalmente pela oposição.
Blog do Curioso: Qual foi o jingle eleitoral mais bem sucedido da história do Brasil?
Prof. Antonio Melo: “Retrato do Velho”, de Getúlio Vargas. Era uma música forte, que todo mundo sabia cantar, e virou hit mesmo depois das eleições. “Varre, Varre, Vassourinha”, de Jânio Quadros, também foi arrasadora. E, nos tempos atuais, depois da redemocratização do país, a que mais marcou foi “Lula Lá”.
Blog do Curioso: Algum partido político costuma fazer melhores jingles eleitorais?
Prof. Antonio Melo: O PT (Partido dos Trabalhadores) tem feito jingles mais marcantes, a exemplo do “Lula Lá”.
Relembre alguns jingles que marcaram a história política do país:
Marcha do Jota-Jota (1955)

Um dos primeiros jingles marcantes da história eleitoral do Brasil foi o da campanha presidencial de Juscelino Kubitscheck. A prepotência de JK transparecia em versos que faziam referência ao hino do Brasil (“gigante pela própria natureza / há quatrocentos anos a dormir”) e nos que exaltavam o próprio candidato (“aparece como estrela radiosa / neste céu azul de anil / o seu nome é uma bandeira gloriosa / pra salvar este Brasil”).
Juscelino foi eleito presidente. Depois de Artur Bernardes, foi o primeiro civil a cumprir o mandato completo.

Varre, varre, vassourinha (1960)
Jânio Quadros nunca escondeu sua excentricidade. E, nas eleições presidenciais de 1960, essa estratégia deu certo. Concorrendo com o marechal Lott, que usava uma espada para representar sua campanha, Jânio lançou um jingle eleitoral descontraído em que brinca com a necessidade de o país varrer a corrupção para longe. A marcha de Maugeri Neto (publicitário que também compôs “A Taça do Mundo é Nossa” e o hino do Santos Futebol Clube) pegou – toca até hoje em carnavais e é reconhecida por gerações que não viveram a era. E a vassoura virou símbolo anticorrupção. O mandato do presidente, entretanto, não foi tão feliz: ele renunciou ao cargo sete meses depois de ser eleito.

Ei, ei, Eymael (1985)

José Maria Eymael (PDC) disputou a primeira eleição direta à prefeitura de São Paulo depois da ditadura militar. Nos preparativos da campanha, o alfaiate José Raimundo de Castro compôs um jingle eleitoral para convencer o candidato a usar seu último nome. A cativante musiquinha fez Eymael, que já estava convencido a deixar de fora o exótico sobrenome, mudar de ideia. Apesar de sua carreira política nunca ter deslanchado (ele tentou a presidência do país em 1998, 2006 e 2010), o jingle é um dos mais famosos do Brasil. É difícil achar quem saiba para quais cargos ele já se candidatou ou quais são seus projetos de governo. Mas muita gente sabe que “ei, ei, Eymael” é “um democrata cristão”.

Lula lá (1989)
Quem compôs o primeiro – e mais famoso – jingle de Lula foi o professor de música Hilton Acioli. Ele não ganhou nada por ela – foi uma contribuição à campanha do PT. A peça marcou tanto que, apesar de só ter sido jingle oficial na campanha de 1989, foi usada informalmente nas quatro outras candidaturas de Lula (1994, 1998, 2002 e 2006). Contribuíram para o sucesso do jingle as gravações de artistas como Gal Costa, Chico Buarque, Elba Ramalho, Gilberto Gil e Djavan.
Os candidatos de 1989 – primeira eleição direta para Presidente da República desde o Golpe Militar de 1964 – capricharam na seleção musical. Além de “Lula lá”, caíram na boca do povo o “Jingle de Ulysses” e o “Jingle do Brizola”. Ironicamente, quem venceu as eleições foi o candidato cujo jingle menos cativou a população: Fernando Collor de Mello.

São Paulo é Paulo (1990)

Paulo Maluf, em 1990, perdeu o cargo de prefeito de São Paulo para Luiz Antônio Fleury Filho. Apesar disso, ele conquistou a grande maioria com seu jingle eleitoral. A música, que exalta o trabalhador paulista, ainda está na boca do povo.

Levanta a Mão (1994)

A estratégia de marketing do jingle de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) era mostrar sua faceta nordestina e conseguir votos fora das regiões Sul e Sudeste, onde ele já tinha conquistado um bom eleitorado. Cantada por Dominguinhos (nordestino), a música de apelo popular fez o maior sucesso. FHC saiu na frente já no primeiro turno e venceu as eleições.

Vote no Rei (1993)
Apesar de não ser propriamente eleitoral, um jingle político que colou na cabeça do povo na década de 1990 foi “Vote no Rei”. Ele fez parte da campanha dos monarquistas durante um plebiscito realizado em 1993 para que o povo brasileiro decidisse o sistema (presidencialista ou parlamentarista) e a forma (monarquia ou república) de governo que deveria ser aplicada no país. A grande maioria escolheu pela república presidencialista, mas o jingle do rei foi parar na boca do povo, rendendo ao sistema monárquico a inesperada marca de 11% dos votos dos paulistas.