O novo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, invade as ruas acompanhado dos não menos assustadores Chucky, o Boneco Assassino, e Darth Vader, o vilão de “Star Wars”. Logo atrás, o seu antecessor, Barack Obama, vem vestido de Tio Sam, ao lado de uma Estátua da Liberdade passista. Ao fundo, a música “Get Up” ganha tons de maracatu. Parece roteiro de Hollywood, mas é apenas o que está programado para a abertura da apoteose dos bonecos gigantes de Olinda (PE). A folia atrai milhares de turistas todos os anos e projeta a antiga capital de Pernambuco no cenário nacional. O artista Leandro Castro, 53 anos, e a mulher dele, Sineide, 49, se preparam para o nono carnaval no comando da “Embaixada de Pernambuco – Bonecos Gigantes de Olinda”. Casados há 25 anos, eles trabalhavam com turismo quando tiveram a ideia de criar, como define Leandro, “uma nova geração de bonecos” em 2006: “Apanhamos muito no começo até chegar ao primeiro boneco do Ariano Suassuna”, recorda. “Para fazer o Pelé foram cinco modelos”.

Chacrinha e Luiz Gonzaga retratados em forma de bonecos gigantes (Fotos: Divulgação)

A embaixada só surgiu algum tempo depois, em 2009, quando Leandro já tinha 30 bonecos. De lá para cá, os modelos se multiplicaram. Hoje, o desfile de 80 bonecões é um sucesso absoluto. Tanto que 63 deles ficam em exposição permanente na Embaixada, no Recife Antigo, e atraem 300 visitantes por dia: “Cobro 10 reais por visitação e consigo manter o projeto apenas com recursos próprios”, orgulha-se Leandro. Ele acredita que, além de ser uma manifestação cultural importante, os seus trabalhos fazem sucesso por causa dos personagens retratados: “É uma forma de se aproximar dos seus ídolos projetados como gigantes no maior momento de alegria nacional”, resume. “Não queríamos apenas fazer personagens pernambucanos, mas sim de todo o mundo. Unir a cultura local com os astros mundiais”. Ao longo do ano, ele faz exposições temáticas. Para contar a história do Brasil desde o seu descobrimento, por exemplo, ele e a mulher selecionaram 50 bonecos que vão desde Pedro Álvares Cabral até o presidente Michel Temer.

A tradição dos bonecos gigantes começou em 1919 e veio da Europa: “Havia em uma cidade do interior do Pernambuco um padre belga que falava muito desses desfiles. Aí, um homem chamado Gumercindo e uma mulher chamada Vitalina criaram o boneco Zé Pereira e desfilaram com ele no carnaval. Foi um sucesso, que logo se espalhou”, conta Leandro. Os bonecões costumam medir entre 3,8 e 4 metros de altura e podem ser manipulados até pelos mais baixinhos – o próprio Leandro, com 1,75 metro, tem menos da metade da altura de suas produções. Hoje, ele expõe os seus trabalhos em eventos como o “Brazilian Day”, a festa dos imigrantes brasileiros em Nova York. Ele também já marcou presença em Paris num encontro mundial de bonecos gigantes. Eventos corporativos completam a agenda cheia dos modelos.

Desfile no carnaval de Olinda tem 80 dos 330 bonecos do acervo

Ao todo, o seu acervo tem 330 bonecos. O número limitado dos que desfilam se justifica pelas dificuldades logísticas. Como o desfile dura duas horas, são necessários 140 manipuladores. Para esse ano, o casal criou 16 novos personagens. O técnico Tite e o cantor Wesley Safadão estarão entre as novidades. Por outro lado, algumas ausências serão notadas. Leandro havia feito um boneco de Hillary Clinton, mas ele foi descartada por ter perdido as eleições norte-americanas. Já o presidente Michel Temer irá se ausentar da festa por precaução dos organizadores: “Há dois anos, não trazíamos o boneco da presidente Dilma e esse ano não traremos o do Temer. Há uma polarização muito grande no país e não queremos que algumas pessoas se aproveitem de um ambiente familiar e festivo para protestar contra quem quer que seja”, afirma Leandro.

O Papa Francisco ficará de fora por causa de um pedido da Igreja Católica – Leandro conseguiu a autorização para reproduzir a imagem do Papa, mas não para usá-lo no Carnaval.

O trabalho leva, em média, 40 dias, mas de vez em quando é preciso deixar tudo pronto às pressas: “Em 2014, usávamos os bonecos nos dias de jogos da Copa do Mundo. Quando vi o uruguaio Suárez mordendo o italiano Chiellini, vi que ali tinha uma boa história. Dois dias depois já estávamos nas ruas com um Suárez Vampiro”, recorda Castro. A escolha dos personagens que serão retratados é feita pelo casal e preza pela relevância dos artistas: “Se vou falar de futebol, começo pelo Pelé. Se vou falar de música popular, começo pelo Roberto Carlos”, explica Leandro. Ainda assim, pedidos do público sempre são levados em conta: “Muita gente me pedia para fazer de duplas sertanejas. Começamos por Chitãozinho e Xororó e Zezé di Camargo e Luciano. Teremos, inclusive, um momento do desfile onde será tocada a música “É o Amor” em ritmo de frevo”, promete ele.

Por uma questão de direitos de imagem, Leandro não faz bonecos de famosos por encomenda, mas atende pedidos de anônimos que eventualmente queiram se materializar em bonecos gigantes – o custo gira em torno de R$ 5 mil. “Nossa ideia não é fazer nenhuma caricatura, mas sim uma homenagem”, avisa. Os bonecos são feitos para durarem a vida toda e recebem pequenos retoques a cada desfile. A apoteose dos bonecos acontece no dia 21, segunda-feira de carnaval, a partir das 10 horas da manhã. A largada será no Alto da Sé, em Olinda. Na terça, dia 22, 50 bonecos estarão no Recife. A saída será às 19h em frente à sede da Embaixada, na Praça do Arsenal, no Recife Antigo.

Os novos modelos da apoteose dos bonecos gigantes: Donald Trump, Wesley Safadão, Chitãozinho & Xororó, Lenine, Keith Richards, James Brown, Freddy Mercury, Estátua da Liberdade com sombrinha de frevo, Luciano Huck, Tite, Marta (jogadora de futebol), Gerson Camarotti (repórter da Globo News), Sérgio Aguiar (apresentador da Globo News) e Almir Rouche (músico pernambucano).